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Eugênio Bucci fala sobre tempos de emoção e crise no jornalismo dia 31

por Universidade Metodista de Piracicaba — publicado 24/03/2015 08h58, última modificação 26/04/2016 15h52

Colunista do jornal O Estado de S. Paulo, da revista Época e autor de livros sobre ética do jornalismo, televisão e comunicação, professor da Universidade de São Paulo (USP), o jornalista e advogado Eugênio Bucci virá ao campus Taquaral da Unimep no próximo dia 31, terça-feira. Nessa data, ele apresentará a conferência Um Conceito de Jornalismo Para Tempos de Emoção e de Crise. O evento, que compõe a aula inaugural do curso de jornalismo, ocorre no Auditório Verde do campus Taquaral, a partir das 19h30. A entrada é gratuita e aberta a todos os interessados.

Em entrevista exclusiva concedida ao Acontece Unimep, Bucci falou sobre as crises no jornalismo brasileiro, a multifuncionalidade de jornalistas e repórteres e a relação entre o jornalismo impresso e o digital, dentre outros assuntos. Acompanhe os melhores trechos:

Acontece Unimep – Atualmente, quais são as crises que o jornalismo brasileiro enfrenta?

Eugênio Bucci – Essa é uma pergunta aberta e também incômoda demais. Aberta porque, para todo lado que se olha há uma crise complicada ligada ao jornalismo. E incômoda por dois motivos. O primeiro é que eu não me sinto bem na posição de alguém que teria uma resposta categórica sobre o assunto. Eu não a tenho. Depois, é incômoda também porque estamos todos incomodados. O sentido geral da crise que vivemos no Brasil, como em outros países, é o desmoronamento dos modelos de negócio da imprensa privada. Por modelos de negócio entenda-se a fórmula pela qual uma empresa (jornalística, no nosso caso) assegura seu faturamento e, portanto, a sua sustentação. O epicentro simbólico dessa crise é o jornal impresso: os anunciantes começam a minguar, a circulação paga cai e os sites não trazem a mesma receita publicitária. Temos aí um paradoxo: a leitura de reportagens nunca foi tão grande (graças às redes sociais, também), e os canais pelos quais se pode ganhar dinheiro nunca estiveram tão congestionados. 
As emissoras de rádio vivem algo parecido, embora a generalização seja perigosa. Nas tevês abertas a situação não é complicada, ainda, mesmo assim todo mundo já sabe que o futuro do jornalismo está ameaçado. Socialmente, institucionalmente, ninguém questiona a necessidade de que o jornalismo exista, seja forte e independente. Economicamente, porém, não se sabe ainda como ele será sustentado, financiado e como será capaz de gerar riqueza. Esse poderia ser, então, um resumo da crise.

Acontece Unimep – O que falta no jornalismo brasileiro atual?

Eugênio Bucci – Falta uma porção de coisas, é claro. Nas redações, falta planejamento. Falta espaço para o jornalismo independente nas emissoras públicas. É incrível que não tenhamos conseguido por de pé, no Brasil, experiências jornalísticas relevantes como temos visto na BBC, da Grã Bretanha, e das PPS nos Estados Unidos, todas emissoras públicas. As emissoras públicas poderiam ser um abrigo essencial para o jornalismo nesses tempos de crise, mas, entre nós, no Brasil, elas praticamente só fazem o elogio das autoridades, com raríssimas exceções. Outra carência que nós temos é clareza. As nossas escolas de jornalismo não sabem definir satisfatoriamente o que vem a ser o jornalismo, o que é muito preocupante. E, para complicar ainda mais, no nosso senso comum achamos que assessoria de imprensa e jornalismo são a mesma coisa. Isso tudo dificulta a compreensão do nosso ofício e, se não o compreendemos bem, não teremos como manejá-lo bem em tempos de incertezas tão ameaçadoras.

Acontece Unimep – Como vê e analisa a multifuncionalidade exigida dos jornalistas atualmente? Com as várias demandas, que o resultado dos textos tende a ser mais precário e superficial?

Eugênio Bucci – Claro que há uma precarização do texto. Ela é clamorosa. Mas não confundamos as coisas. Essa tal multifuncionalidade acabou sendo algo espontâneo nas novas gerações, que já nasceram com os meios integrados pelas tecnologias digitais. Qualquer criança hoje faz edição de vídeo, retoque  de fotos, montagem de áudio e mais não sei o quê. E muita gente sabe o básico de programação. Isso é bom. É positivo. Isso não significa, porém, que todos farão tudo ao mesmo tempo. Há lugar e há necessidade para o sujeito que é muito bom para escrever e para o que é muito bom para fotografar. Isso não mudou. O fato de que qualquer cidadão consiga operar um gravadorzinho digital não significa que ele possa ser jornalista. O fato de qualquer pessoa saber ler e escrever não significa que ela seja obrigatoriamente uma romancista ou uma ensaísta de primeira grandeza. A tecnologia varre de uma vez as tarefas mecânicas que tínhamos de fazer antes delas, mas não revoga o talento e a excelência, que são virtudes insubstituíveis.

 Acontece Unimep – O senhor acha que as redes sociais se fortalecem pelo fato de o jornalismo impresso não oferecer mais tanto espaço para a contestação e a liberdade de opinião que as mídias sociais permitem?

Eugênio Bucci – Não exatamente por isso. Elas não deram certo porque o jornalismo impresso tenha dado errado. Elas apenas nos abrem outras formas de interlocução. É uma nova -- e inédita -- forma de oxigenação da esfera pública.  

Acontece Unimep – Conte uma história marcante ocorrida com você em sua trajetória como jornalista. Por que essa história é significativa para você?

Eugênio Bucci – Uma vez me  encantei com uma linda dona de aquários e terrários, quando era repórter. Aprendi ali que o envolvimento entre jornalista e fonte pode não ser bom para a matéria -- embora seja prazeroso para o nosso corpo miserável.

Acontece Unimep – Cite três dicas que considera fundamentais para jornalistas em início de profissão?

Eugênio Bucci – Primeira dica: só trabalhe num lugar em que exista alguém que você enxergue como um modelo, uma inspiração, um ídolo. Não importa o dinheiro (não nesse começo). Segunda: um sujeito talentoso normalmente tem facilidade de fazer aquilo que outros penam para conseguir realizar. Escrever, por exemplo, requer talento. Mas se você usa o seu talento para fazer depressa o que outros vão demorar para fazer, você está perdido.
É preciso trabalho, é preciso esforço, é preciso suor. O seu trabalho só terá realmente valor se, ao talento, você souber juntar uma dose altíssima de esforço, de disciplina e de dedicação. Sem isso, nada feito. Terceira: não procure um emprego, procure um trabalho. Pense que você pode ser o patrão de si mesmo -- e também de outras pessoas. Pense que você pode criar um veículo, uma nova forma de fazer jornalismo, tanto no mercado, como no âmbito das emissoras públicas e, ainda, também no terceiro setor. 

 

Texto: Angela Rodrigues
Fotos: divulgação
Coordenação/edição de texto: Celiana Perina
Última atualização: 24/03/2015

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