Música caipira das décadas de 1940 e 1950 é tema de artigos de docente de história
Letras de música nos gêneros cururu e moda de viola escritas, mas não gravadas, e que estão intimamente relacionadas à experiência de trabalhadores rurais e urbanos da região de Piracicaba nas décadas de 1940 e 1950. Essas foram as descobertas do professor do curso de história da Unimep, Uassyr Siqueira, ao longo de quase dois anos de pesquisa para o seu pós-doutoramento, concluído pelo Instituto de Arte da Unicamp. No projeto, o principal objetivo de Uassyr foi entender as relações entre o trabalho, a política e a música caipira produzida na região de Piracicaba. O resultado desse trabalho pode ser conferido em dois artigos divulgados em veículos distintos: na publicação digital Tempos Gerais (Volume 7, Número 2, 2015), Revista de Ciências Sociais e História da Universidade Federal de são João Del Rei, e na revista Música Popular em Revista, veículo oficial do grupo de pesquisa Música Popular: História, produção e Linguagem, que reúne pesquisadores da Unicamp.
No artigo Folclore, música caipira e trabalho (Piracicaba, 1940-1950), publicado na revista Tempos Gerais, Siqueira analisa a música caipira produzida na cidade de Piracicaba, sobretudo o cururu e a moda de viola. Ele conta que várias letras foram armazenadas pelo Centro de Folclore de Piracicaba, organização criada em 1945 para incentivar as tradições populares da cidade e regulamentar as atividades folclóricas e musicais. “Notamos que, apesar da incipiente profissionalização, os músicos não conseguiam sobreviver exclusivamente de sua arte e exerciam outras profissões. As letras analisadas expressavam as impressões dos músicos acerca das condições de trabalho no campo, na cidade e também sobre suas atividades musicais”, afirma.
Já no texto O cururu de Sebastião Roque: aspectos da música caipira (1940-1950), divulgado na revista Música Popular em Revista, o professor aponta que algumas letras escritas por Roque nas décadas pesquisadas expressam elementos tradicionais da música caipira, como a forte presença da religiosidade, mas também temas relacionados a problemas urbanos. “As letras escritas por esse compositor são ricos testemunhos acerca da experiência dos trabalhadores da região de Piracicaba, classe à qual muitos cantadores pertenciam”, destaca.
Cururu e moda de viola
Ambos os artigos resultam do projeto de pós-doutorado Música sertaneja, trabalho e política concluído por Siqueira, que além de docente, também é músico autodidata, toca viola caipira há quase vinte anos e faz parte da Orquestra Filarmônica de Violas de Campinas. Ele conta que as pesquisas foram desenvolvidas a partir do acervo do escritor e folclorista João Chiarini, localizado no Espaço Memória do Centro Cultural Martha Watts. “Analisei letras de músicas (cururu e moda de viola, principalmente), correspondências e atas de reuniões do Centro de Folclore de Piracicaba, e alguns artigos sobre a música caipira produzidos por Chiarini”, conta. O projeto foi financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
O professor destaca também que o fato de encontrar letras escritas, mas não gravadas, mostrou que a música caipira, em processo de transformação desde as primeiras gravações em disco em 1929, vai muito mais além do que o registrado pela indústria do disco. “Além disso, também foi possível acompanhar de perto a atuação do Centro de Folclore de Piracicaba: uma associação cultural, mas com característica de sindicato e também lugar de militância de membros do Partido Comunista Brasileiro (PCB), como o próprio João Chiarini”, afirma.
Dentre os elementos que mais chamaram a atenção de Siqueira na pesquisa foram o perfil social dos violeiros e cantadores, “que exerciam outras profissões, pois não era possível sobreviver unicamente da música”; e os temas relacionados às condições de trabalho no campo, na cidade e os políticos. “Questões sociais e políticas não compõem a ampla maioria do acervo de João Chiarini. No entanto, isso revela um fator importante: a relação entre musica caipira e o cotidiano dos músicos e violeiros da região de Piracicaba, que também faziam da música um canal de expressão de suas opiniões”, afirma.
Texto: Angela Rodrigues
Edição: Celiana Perina
Fotos: Fábio Mendes
Última atualização: 02/09/2016